quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Mudança dos Ventos

Ivan Lins & Vitor Martins
Canta: Nana Caymmi
Ah, vem cá, meu menino
Pinta e borda comigo
Me revista, me excita
Me deixa mais bonita

Ah, vem cá, meu menino
Do jeito que imagino
Me tira essa canseira
Me tira essas olheiras
De esperar tanto tempo
A mudança dos ventos
Pra me sentir com forças
Prá me sentir mais moça
Ah, vem cá, meu menino
Pinta e borda comigo
Me revista, me excita
Me deixa mais bonita
Ah, vem cá, meu menino
Do jeito que imagino
Me tira essa vergonha
Me mostre, me exponha
Me tire uns 20 anos
Deixa eu causar inveja
Deixa eu causar remorsos
Nos meus, nos seus, nos nossos...

Muda, vento!
É bom isso. Dizem que todo adolescente tem sua fase comunista...  =]

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Verniz

Voz: Fabiana Cozza / Composição: Sérgio Santos e Paulo César Pinheiro

Eu tenho anseio demais.
Sei que não é direito,
Desejo nunca deu paz,
Mas deixa ardente o leito.
Eu sempre fui mesmo assim,
Sou meio insatisfeito.
Não é um retrato de mim,
Mas é o mais perfeito.
Com o sonho acordo
Porque com a ilusão me deito.
A vida é mais que um prazer,
Mas, como vem, aceito.
Não trago nos olhos meus
Nenhum amor desfeito.
A ausência não é um adeus,
Mas causa o mesmo efeito.

Eu tenho mágoa de amor,
Mas tudo tem seu jeito.
O tempo não cura a dor,
Mas enverniza o peito.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

Ainda

Trilha.

Ele transforma os fios de esperança em rastilhos, sempre voltados na minha direção. Ele suprime a minha voz e me enche de gritos envenenados de rancor. Ele condensa meus silêncios em nuvens que viajam vagarosas em horizontes de avião. Ele apaga a luz sem dar boa-noite. Ele desenha rachaduras caprichosas no que me sustém. Ele planta sonhos exaustos e jura florescência. Ele afaga meu cansaço com luvas de espinho, cobertas de veludo vermelho pra disfarçar quando o sangue cede. Ele é a cantiga da minha mente sem lembrança. Ele azeda meu comercial de Molico. É os beijos do outro, a boca alheia entre a salvação e o autoescárnio. É a lata vazia que zomba da sede. Ele é o que parece partir sem nunca ter ido. É o que parece estar sem nunca ter chegado. É o que transforma a fé em abandono. É o acorde que crucifica o compositor insone. Ele atravessa as madrugadas com pés de vento e zumbe mosquito no ouvido quando eu quero dormir. Ele chama meus demônios pelo nome. Mas é ele que faz o rio sair do curso e dá de beber ao tempo, que põe visões no olho do cego, que traz a própria dor pra estampar a dor do outro em nenhuma. É a primeira nota de Enrico Rava. É a hora entre a noite e a manhã. Ele é a condenação da face eterna.
Ele é o preço que eu nunca vou pagar.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Sorrateiramente

A água da chuva verteu pelo peitoril da janela aberta, escorreu pela cabeceira da cama logo embaixo e encharcou o carpete novo. De azul-celeste-novos-ares, ele passou a azul-noite-todo-manchado. Aspirador. Secador. Desumidificador. Limpador. E a mancha lá. Abriu a janela, rezou pra ver Sol, entrar calor. Calor dias. E a mancha lá. Um mês sem chover, e ela continuava fechando a janela todo fim de tarde, dormindo abafada no cômodo fechado, pra não aumentar mais a mancha, vai que chove outra vez. Até que, outra noite, certa que-foi-isso-de-repente noite, uma cigarra pousou na janela. Magnetizada pelo céu estrelado e pela ideia do dia radiante que viria, deixou a janela aberta. Despertou no meio da madrugada, com o som de uma chuva torrencial. Sentiu os primeiros pingos batendo na cabeceira, depois no rosto. O carpete, azul-arrependimento. A cigarra jazia morta no trilho de alumínio. Também tinha sido traída – com um golpe de chuva, no quarto de dormir, pelo Coronel Retaguarda.

Desmentido


Ele transforma meu tempo numa eterna contagem regressiva. Retém meus delírios sequestrados num fastio congelado entre a coragem e o perdão. Faz-se de brisa úmida pra me confundir a primavera e encher de invernos meu coração. Sopra melodias de grilos dentro de realejos, explode jabuticabas doces da sua boca pra minha, injeta promessas de calafrios, afirma-se pela pele e desmente-se em ausência. Faz meus minutos evaporarem a cada fôlego que eu não consigo nunca recuperar. Ele é o cio da minha fêmea, o cisco no olho esquerdo, a violência da minha legião, a cria recém-nascida que não vai vingar, o barravento do meu cavalo, a vela da iaô.  Eu me rendo em véu e aldeia. Ele acena condição. Eu comungo tempestades. Ele afaga mansidão. Eu adestro impropérios. Ele me toma pela mão. Ele é o meu Inferno. Eu sou o seu Cão.

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Solvência

Símio, limbo oculto atrás da ausência
Teste ferro venta por entre a premência
Fundo oculto ventre ou onipotência
Véu detrás do gosto susta ascendência

Meu de tanto nosso, urgência
Soma mais de quem, anuência
Fogo fátuo, nós, excrescência
Findo, não, sem fim de falência

Morro cor, de dar impotência
Sal de luz, sonhei persistência
Fogo fátuo, nós, emergência
Findo, não, sem fim, permanência

Vem, com dentes, cala opulência
Susto medo pós-adolescência
Som silêncio caso inocência

Morta, calo de violência
Sopro de luz aquiescência
Hoje não, traveis, todo dia... resiliência.

sábado, 24 de julho de 2010

UM CENTÍMETRO E MEIO

Uma moeda de um real tem um centímetro e meio.
Com ela dá pra comprar um pão
E matar a fome.

Um classificado tem um centímetro e meio.
Com ele vende-se um apartamento
Pra sumir no Canadá.

Uma lombada de Saramago tem um centímetro e meio.
Nela cabe um mundo de histórias
Pra matar outra fome.

Um selo postal tem um centímetro e meio
Com ele mando notícias pra quem espera
Viver no antigo  eu-que-fiz-pra-você.

Uma palheta do Ciro Visconti tem um centímetro e meio
E carrega a gente pra uma dobra onde o som
É só o coração da memória.

Um sachê de sal tem um centímetro e meio
Sorriso amarelo pra quem precisa estar certo
Ainda que se ame o errado.

No ultrassom, um centímetro e meio, O Feijão tem!
Causa dele, não sofro, não corro, não peço socorro nunca mais.
Virei luz. Amém.

quarta-feira, 21 de julho de 2010

ACALANTO DO AMOR PRA SEMPRE

Pra Cabel.

Dorme, meu amor, o sono dos justos.
Dorme o sono que te protege
Dos males da vida,
Da indiferença, do azedume do rancor.

Dorme, meu amor, o sono dos anjos,
Que te resguarda da hipocrisia,
Do desalento e da ruína
De provar dissabor.

Dorme, meu amor, que te protejo
Do teu sonho de criança velado
Cuidarei eu
Do teu sonho acordado de adulta
Cuidaremos juntas.

domingo, 11 de julho de 2010

Convite


Preciso dizer que te espero? =]

terça-feira, 6 de julho de 2010

Furto

(da arte de ser ida)

Transitória e de passagem,
ela observa
estática
a paisagem
em movimento.
Mesmo parada,
o dia continua indo,
a noite continua vindo,
e não há maré que
nessa hora
se interrompa porque
o tempo da moça
não é pra agora.

Há que mover e partir,
sem adeus formal
cristalizado
que nem é mais
necessário.
Achado o adeus implícito
da descrença e
do descaminho,
está forjada,
e temperada
,
a partida
mais exuberante,
pelos sonhos indomados
e tão falantes
(reais depósitos
de desatinos,
que esfacelam até
a mudez determinada
dos silêncios cabotinos
e transformam propósito
em talante).

É na despedida calada
que o tempo, caprichoso,
expõe a face veraz e petrificada
das decisões equivocadas.

É no vazio da inanidade
que nos são roubadas,
por outros mais vorazes,
as razões e as mulheres mais amadas.

quarta-feira, 30 de junho de 2010

CONTAGEM DIGRESSIVA

Pinta teus olhos de vermelho
e vê, então, pulsar em todas as coisas o meu sangue.
Rega tuas pausas com espelhos
e repara a tua ausência...

Afeiçoa teus sonhos em nuvens:
sente meu medo.
Rasga os desvios a faca
e prova o gosto dos meus gestos.

Cubra de musgo a sua fome,
evolva-se em música,
triture os relógios da casa,

ouça nada além da simplicidade,
e entenda, finalmente,
o tamanho da minha saudade.

terça-feira, 22 de junho de 2010

Through drowning

Detrás da janela do terceiro andar
marchavam os lírios
em hipnose
pelos campos cegos do delírio
cruzavam arais de sombra
avançavam
em carne viva de sal.

Pelo corredor
sussurravam as teias de aranha
monocórdias e fatais
como a vinda
de outra noite,
dolorosas como hibernar,
náufragas do tempo.

Lágrimas de gafanhoto
e visco do silêncio
das cigarras
desgrudam-se
das paredes
e ouvem-se
raízes claustrofóbicas
condenadas
pelas sementes
a não ser galho
jamais.

De um
lado
de outro
canto
de dentro
luz.

Foi quando,
num gesto simples,
ele fechou as cortinas.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Vício e paixão

João Callado/Ivor Lancellotti

Sair de vez, sem ter talvez,
só assim dá pra esquecer.
Vício e paixão só se deixa,
infelizmente, de uma vez,
e é ruim de perceber.
Nem sei como dói,
mas quero tentar.
Se suportar dessa vez,
nunca mais penso em voltar.

Quando o amor perde o sabor
e o fel toma o lugar,
isso é ruim,
esse mel como querer cristalizar...
Nós devemos concordar.
Não vê que acabou?
Ficar é penar...
É bem melhor pra nós dois
se não dá pra disfarçar.

O bonde da ilusão passou ontem por nós
e nem sequer parou,
partiu pra nunca mais.
Vazios de amor,
ficamos por aqui.
Então pra que esperar
se não dá mais pra seguir?

Sair de vez, sem ter talvez,
só assim dá pra esquecer.
Vício e paixão só se deixa,
infelizmente, de uma vez,
e é ruim de perceber.
Nem sei como dói,
mas quero tentar.
Se suportar dessa vez,
nunca mais penso em voltar.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Susto vazio

Não é sem receio que escrevo.

Não é espontâneo, nem caso pensado.

É mais espanto, susto congelado,

que obriga a fazer o que não devo.


Cada dia que passa, cada hora moldada

transformou-se em hora perdida, escoada,

como bolas de prata flutuando no vazio,

vento quente barrado pelo frio.


A aflição desdobrou-se noutra dimensão

quando sentei os pensamentos na calçada:

perto do tempo infinito do lado de dentro,

o que voa por fora não serve pra nada.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Canto de acordar

Quantos barcos atracaram
E eu?
Eu não era cais. Era mar.
Quantas galés afundaram
E eu?
Eu não era mar. Era o Vento.
Quantas jangadas lançadas
E eu?
Eu não era espaço. Era o Tempo.
Quanta ampulheta virada
E eu?
Eu não era areia. Era medo.
Tantas pegadas marcadas,
Tanta mancha roxa,
Tanta porrada,
E eu não era o rosto. Era o tapa.
A vida deixando as marcas na memória
E eu?
Eu sou história.

domingo, 2 de maio de 2010

DEFENSORIA

Não acorde o que não viu dormir.
Não lamente o que não viu sangrar.
Não ressinta o que jamais restou,
não me peça um pouco mais do que acabou...

Não ajunte os sentimentos maus,
Não desminta o bem que me negou.
Esqueça de outro verso do passado,
Ponha a culpa de lado,
Apague o que passou.

Cerre os dentes, em silêncio,
Engula a raiva
De me ver acalentada
Noutro amor sem ser o teu.

Foi pouco, foi por pouco,
Quase nada.
E agora, acostumada, sigo a estrada.
Mas já sei
O castigo, o pior,
O mais antigo:
No couro em que nascer, o asno há de morrer.

São cores, são dores,
Do amor que não me deu.
São flores, amores
Que jamais terás nos braços meus.

quinta-feira, 18 de março de 2010

Uma Canção Inédita

Dentro do seu coração
Guarde esta canção inédita
Que num cantinho intocado
Será pra sempre inédita
Pode tudo consumir
O tempo que passa feroz
Mas esta valsa há de deixar pra nós

Fiz uma canção discreta
Só para você
Ninguém pode saber da letra
Que você lê

A música você desfruta
Os ouvintes não
Penetra a orelha e sai por outra
Cada refrão

Se outro amor surgir um dia, a valsa perde o ar
Definha
Mas se você descabeladamente me esperar
Sozinha no breu
Pé ante pé
Abra aos poucos o coração
E deixe
Ecoar nossa canção
E feche

Venha ouvir a valsa oca
Em primeira mão
Que a luva distraída toca
No violão

O público não acredita
Crítico não crê
Na inédita canção escrita
Só pra você

Se você beijar um outro, pode se partir
A valsa
Mas se roendo-as-unhasmente me quiser ouvir
Descalça no breu
Pé ante pé
Abra o peito bem devagar
E deixe
Sete notas a vibrar
E feche

Guarde numa caixa preta
A tímida canção
No fundo falso da gaveta
Do coração

É valsa pra se ouvir por dentro
Pra se ouvir a sós
Pra não se dissipar ao vento
Com minha voz

Com minha voz...